BrasilVOCAÇÃO BOLIVARIANA

IVES GANDRA DA SILVA MARTINS,
Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIP, UNIFIEO, UNIFMU, do CIEE/O ESTADO DE SÃO PAULO, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército - ECEME, Superior de Guerra - ESG e da Magistratura do Tribunal Regional Federal – 1ª Região; Professor Honorário das Universidades Austral (Argentina), San Martin de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia); Doutor Honoris Causa das Universidades de Craiova (Romênia) e da PUC-Paraná, e Catedrático da Universidade do Minho (Portugal); Presidente do Conselho Superior de Direito da FECOMERCIO - SP; Fundador e Presidente Honorário do Centro de Extensão Universitária – CEU-Escola de Direito/Instituto Internacional de Ciências Sociais - IICS.

A edição do Decreto 8243/14 pela Presidente Dilma, instituindo Conselhos junto aos diversos Ministérios, com funções nitidamente de imposição às políticas governamentais, está na linha do aparelhamento do Estado, que pretende criar uma nova classe dirigente no estilo denunciado por Djilas na “A Nova Classe”, quando o fantasma soviético preocupava o mundo ocidental.

Objetiva tornar o Executivo, o verdadeiro e único poder, reduzindo o Congresso Nacional a um organismo acólito.

Tive a oportunidade de ler as Constituições da Venezuela, Bolívia e Equador, a pedido da Fundação Alexandre de Gusmão, quando presidida pelo Embaixador Jerônimo Moscardo, que veiculou o texto de todas as Constituições das Américas, com estudos de constitucionalistas de diversos países.

Impressionou-me a imensa diferença entre os três textos e o da brasileira, que, no artigo 2º, assegura a independência dos Poderes.

É de se lembrar que o Poder Executivo, politicamente, não representa o povo por inteiro, mas apenas sua maioria e, nos casos em que o Chefe do Executivo foi eleito em  2º turno, nem a maioria.

Por outro lado, o Poder Judiciário é apenas um poder técnico, sendo a Suprema Corte escolhida por um homem só, o Presidente da República.

A totalidade da representação popular está no Parlamento, constituído que é por representantes do povo favoráveis ao governo e daqueles contrários a seus detentores. Pode não ser o ideal, mas representa a vontade de toda a sociedade.

Ora, nas três Constituições bolivarianas, o Legislativo é amesquinhado, ao ponto de, na Carta Venezuelana, poder declinar de sua competência, transferindo-a para o chefe do Executivo. Os plebiscitos e referendos, nestas Constituições, podem ser convocados pelo Presidente. No Equador, o Presidente pode dissolver o Parlamento, mas, se este o  destituir, dissolve-se automaticamente. Na Bolívia, a Suprema Corte é eleita pelo povo, cuja manipulação pelo Executivo não é difícil.

É que tais modelos conformam um sistema político de dois poderes principais e três poderes secundários, a saber: o Executivo e o povo, os principais, e o Judiciário, Legislativo e Ministério Público, secundários.

Ora, como o povo é facilmente manipulado, em regimes de Executivo forte, os modelos dos três países têm um único Poder,  sendo a população  facilmente enganada. Não se pode esquecer que o culto povo alemão foi envolvido por Hitler, o mesmo acontecendo com o povo italiano por Mussolini,  para não falar dos russos, nos tempos de Stálin.

Ora, o referido decreto pretende substituir a democracia das urnas por aquela dirigida pelo Executivo, com seus grupos enquistados em cada Ministério. Se o Conselho da Comunicação Social entender que deve haver controle da mídia, o Executivo, prazeirosamente, dirá que o fará, pois esta é a “vontade dos representantes da sociedade civil organizada”!!!

A veiculação do Decreto, em momento no qual torna-se evidente o clamoroso fracasso da política econômica do governo Dilma, obrigará um futuro Presidente, se sério e competente, a realizar um forte ajuste de contas.
Se decidir extinguir os Conselhos, poderá ser acusado de estar “agindo contra o povo”, e, se os mantiver, terá dificuldades de governar.

Na eventualidade de ser a Presidente reeleita, poderá impor seus sonhos guerrilheiros, que ficaram claros, quando, em atitude de adoração cívica, na recente visita a Fidel Castro, teve estampada sua fotografia com o sangrento ditador cubano.

É isto que me preocupa, em face de sua permanente proteção ao falidos governos boliviano, venezuelano e argentino, assim como a resistência em firmar acordos bilaterais com países desenvolvidos, sobre dar sinais de constante aversão à lucratividade das empresas, seja nas licitações, seja através de esdrúxula política tributária, indecente para um país como o Brasil. Tornou, por exemplo,  a Petrobrás e a Eletrobrás instrumentos de combate à inflação pelo caminho equivocado de controle de preços. Tal política  sinaliza que dificilmente fará os reajustes na esclerosada máquina administrativa.

Com os Conselhos criados, sempre que o governo tomar uma medida demagógica, poderá dizer que a “sociedade civil organizada” é que a está exigindo.

Por esta razão, é de se compreender o discurso ultrapassado, do século XIX, de luta contra as elites, apresentado pelo Presidente Lula, preparando o terreno para medidas “a favor do povo” e contra “os geradores de empregos”, que, na sua visão, são os ricos. Por isto, também Putin, que deseja restaurar o Império Soviético, é para a Presidente um parceiro melhor que Obama, representante para ela da “oligarquia econômica”.

Como cidadão, respeitando a Presidente pelo cargo que ocupa em razão de uma eleição democrática, tenho, todavia, cada vez mais receio de que o eventual risco de perder o poder leve  seu grupo a ser dirigido pelos mais radicais, que se utilizarão dos Conselhos para, definitivamente, semear a cizânia, na renascida democracia brasileira.

A2014-049 VOCACAO BOLIVARIANA

Fonte: Enviada pelo autor (24/07/2014)